sexta-feira, 19 de março de 2010

100 coisas para não perder em Pernambuco - Parte 5

41. Monte dos Guararapes - "Se ele se ausentar deste Estado, muito em breve se há de tomar e aniquilar tudo que com sua presença floresceu e se alcançou", anteveu Fernandes Vieira em 1644. Após vários meses em conflito com os seus patrões, o Conde Maurício de Nassau renunciou ao governo do Brasil Holandês, e, pranteado por indígenas, negros e europeus de várias nações, partiu. Finda a memorável administração do fidalgo e mecenas, teve início a Restauração, confirmando as piores premonições. A 1ª batalha ocorreu já no início de 1645, no Monte das Tabocas (Vitória de Santo Antão). Os flamengos foram vencidos e em pouco tempo foram completamente encurralados no Recife. O golpe de misericórdia veio, contudo, 3 anos depois, quando em abril de 1648 (1ª Batalha dos Guararapes) os dois exércitos rivais se enfrentaram no Monte dos Guararapes, hoje Parque Histórico Nacional, e os cerca de 4.500 holandeses foram vencidos por 2.500 luso-brasileiros chefiados pelos brancos Fernandes Vieira e Vidal de Negreiros, pelo negro Henrique Dias e pelo índio Felipe Camarão, embate que passou à História como aquele que lançou as bases do nacionalismo brasileiro, unindo as 3 raças. Quase um ano depois, no mesmo lugar, ambos voltaram a se enfrentar (2ª Batalha), com mil perdas do lado holandês e pouco mais de 100 do brasileiro, dentre as quais a de Henrique Dias. Em 1654 os flamengos deixaram de vez o Brasil.

42. Ruínas de Nazaré e praias do Cabo - No Cabo de Santo Agostinho, antigo Cabo de Santa Maria de la Consolación, a História difere da versão oficial. Para os munícipes, foi aqui que o Brasil foi "descoberto" em 26 de janeiro de 1500 pelo navegador espanhol Vicente Pinzón, 3 meses antes do desembarque cabralino, portanto. O grande promontório avistado por Pinzón é, nada mais, nada menos, que o último ponto de ruptura entre os continentes Sul-Americano e Africano, há centenas de milhares de anos. No Cabo, a História se faz sentir aos 4 cantos. A Vila de Nazaré e o Forte Castelo do Mar remontam aos Séculos XVI e XVII, cenários que foram das guerras contra os índios caetés e contra os holandeses. Suas charmosas ruínas fazem a fama do lugar, com os belos engenhos, como o Massangana (ver item 46), completando o roteiro. E por falar em fama, é no Município, bem como no vizinho Ipojuca, que se encontram algumas das mais belas praias do litoral pernambucano. Pedra do Xaréu, Itapuama, com seus banhos de caulim, as paradisíacas Enseada dos Corais, Gaibu e Paraíso, sede do Eco Resort, a belíssima Calhetas, uma pequena baía repleta de pedras sob as águas, Suape e Paiva, com sua popular reserva de Mata Atlântica, conformam a impressionante região costeira cabense.

43. Porto de Galinhas - Até 1990, a Praia de Porto de Galinhas estava isolada do mundo, apesar dos meros 70km que a distanciam do Recife. Dali a pouco, a Vila de Pescadores virou destino para o descanso de celebridades. Rapidamente os empresários passaram a explorar o potencial turístico do lugar e não deu outra: a Praia se tornou um dos cartões-postais mais célebres do litoral brasileiro. Quando os visitantes chegam ao balneário, há 10 anos considerado o melhor do país, encantam-se com a bela paisagem paradisíaca, que abriga vegetação tropical, bancos de areia e águas cristalinas. A temperatura morna da água convida-os a um demorado e delicioso banho de mar. A diversão também fica por conta das famosas piscinas naturais, formadas pelos arrecifes de corais e nas quais é não só possível, como absolutamente imperdível, nadar ao lado dos peixes coloridos. Para os que gostam de adrenalina, a região também é favorável à prática de esportes radicais, como o surf e o kitesurf, em especial na vizinha Praia de Maracaípe, e mergulho, sendo ainda possível realizar passeios ecológicos para conhecer a exuberância da natureza local. A infra-estrutura turística de Porto de Galinhas é excelente e inclui sofisticados hotéis, pousadas e chalés. Uma última dica: não saia de lá sem provar algum dos famosos pastéis da Pastel do Porto.

44. Praias do Litoral Sul e Tamandaré - As praias do Litoral Sul pernambucano estão entre as mais belas e famosas do país. Piedade, Candeias e Barra de Jangada (Jaboatão); as praias do Cabo (ver item 42); Gamboa, Muro Alto, Cupe, Porto de Galinhas, Maracaípe, Enseadinha, Serrambi, Cacimbas e Toquinho (Ipojuca); Barra de Sirinhaém (Sirinhaém); Guadalupe, Carneiros, Campas, Tamandaré e Boca da Barra (Tamandaré); Porto e Mamucambinhas (Barreiros); Várzea do Una e Coroa Grande (São José da Coroa Grande) são elas. Piedade completa o circuito urbano iniciado no Pina e que tem por ponto alto Boa Viagem (ver item 16). Porto de Galinhas dispensa comentários, vez que é a praia mais famosa do país (ver item 43). Maracaípe é o refúgio dos surfistas, tirando vantagem do prestígio da vizinha Porto de Galinhas. Mas as duas praias mais impressionantes do extremo sul pernambucano são mesmo a utópica Praia do Porto, com sua simpática Ilha do Coqueiro Solitário, imortalizada na novela "A Indomada" da Rede Globo, e a paradisíaca Praia dos Carneiros, com uma belíssima vista dos terraços de Guadalupe e da Ilha de Santo Aleixo (Sirinhaém). Depois de Porto de Galinhas, Tamandaré é o principal balneário do Litoral Sul, lotado durante os eventos do verão e dispondo, além das famosas piscinas naturais, de atrativos como o Forte de Santo Inácio de Loyola (1691) e a Reserva Ecológica de Saltinho.

45. Resorts do Litoral Sul - O fenômeno de "resortização" do badalado Litoral Sul pernambucano é relativamente recente, remontando à inauguração do antigo Blue Tree Park Resort, atual Eco Resort, no Cabo de Santo Agostinho. Mas a Sauípe pernambucana é mesmo a Praia de Muro Alto, vizinha de Porto de Galinhas. O Summerville, com sua famosa piscina em formato de rio projetada pelo mago dos resorts, o arquiteto Luiz Vieira, segue sendo um dos 10 melhores do país. O vizinho Nannai e seus cobiçados bangalôs sobre palafitas também consta do Top 10, mas costuma encabeçar a lista de destinos de sonho de casais em lua-de-mel. Os outros dois grandes hotéis de Muro Alto, o Marulhos e o Beach Class, têm tamanho e estrutura básica de resort, mas funcionam como flat. Todos os apartamentos e bangalôs são suítes com cozinha equipada. Um pouco mais simples, o Marupiara tem uma piscina não tão grande como as de seus vizinhos, mas em compensação está no melhor ponto da praia, defronte dos aquários naturais. Estanto já superlotada Muro Alto, novos e arrojados empreendimentos são esperados para a Praia do Cupe. É lá que está o 1º resort-design do país, o Enotel, com apartamentos quase philippe-starckianos, que passam longe dos tons e estampas tropicais que predominam nos hotéis de praia.

46. Engenhos do Litoral e da Zona Mata - Pernambuco foi a mais bem-sucedida das Capitanias Hereditárias graças à administração brilhante e eficiente do donatário Duarte Coelho. Ele trouxe consigo colonos que deram início à sistemática e irreparável derrubada das matas litorâneas e à instalação dos primeiros engenhos, tirando vantagem do fértil solo massapê. O longo e rendoso reinado do açúcar em terras brasileiras foi o motor do desenvolvimento pernambucano e a razão da invasão holandesa. Vestígios dessa época áurea ainda podem ser encontrados nos Municípios do Litoral e Zona da Mata. Os principais Engenhos são o Uruaé (Goiana), no qual viveu o Conselheiro João Alfredo, redator da Lei Áurea; o Massangana (Cabo de Santo Agostinho), lugar de residência, por sua vez, do grande abolicionista Joaquim Nabuco; o Gaipió (Ipojuca), associado à Revolução Praieira; o Poço Comprido (Vicência), que serviu de abrigo aos líderes da Confederação do Equador, dentre os quais Frei Caneca; e o Verde (Palmares), no qual nasceu o poeta Hermilo Borba Filho. É possível ao visitante ficar hospedado em algumas das Casas Grandes, desfrutando da indescritível sensação de retornar ao passado, tudo isso ao impecável sabor culinária regional servida nos fartos cafés da manhã coloniais. Puro charme!

47. Maracatu de Nazaré da Mata - Saem de cena os bóias-frias e entram os caboclos-de-lança. Ao contrário do Maracatu Nação (ou do baque virado), mais presente na área urbana e oriundo da tradição do Rei Congo, com cortejos espelhando os rituais das antigas cortes africanas transplantadas para o Brasil, o Maracatu Rural (ou do baque solto) nasceu da fusão de vários folguedos populares que existiam sobretudo nos engenhos de cana-de-açúcar da Zona da Mata Norte de Pernambuco, refletindo a reação bem-humorada dos caboclos, índios miscigenados com brancos e negros, ao processo de engolimento de suas terras pelos canaviais. Nazaré da Mata, conhecida como a "Terra dos Maracatus", foi o centro desse fenômeno, e não é de surpreender que seja uma das 3 bases de atuação do maracatu em Pernambuco, ao lado do Recife e de Cidade Tabajara (Olinda). É de lá o Maracatu Rural mais antigo de todos, o Cambinda Brasileiro, fundado em 1898. Outros destaques são o Piaba Dourada, o Estrela de Ouro e o Coração Nazareno, num total de 20. Todas as segundas e terças-feiras de Carvanal acontece o esperado e multicolorido Encontro dos Maracatus, um evento sem igual.

48. Cerâmica de Tracunhaém - A cerâmica artesanal faz a fama de Tracunhaém, um dos centros de excelência desse tipo de arte popular no Brasil. Imensas esculturas em argila, matéria-prima facilmente encontrada às margens do Rio Tracunhaém, decoram o acesso à cidade, dando boas-vindas aos visitantes. Do barro em estado bruto surgem figuras que, em sua maioria, retratam imagens paradoxais, quais santos católicos e cenas profanas. Um dos maiores incentivadores da arte cerâmica no Município foi o célebre colecionador pernambucano Abelardo Rodrigues. Através dele, os objetos ali produzidos foram aceitos nos grandes centros, compondo inclusive o acervo dos principais museus brasileiros e estrangeiros. Os principais mestres do lugar são Zezinho de Tracunhaém, autor de imagens sacras e presépios, e Nuca, que também trabalha com imagens representando cenas do cotidiano nordestino, além de confeccionar os famosos leões símbolos do Estado. Nos últimos tempos, a cerâmica mais elaborada vem, todavia, perdendo espaço para a produção em série de peças utilitárias, também encontradas no Centro de Produção Artesanal, que reúne 35 artesãos da cidade. De passagem pela região, não deixe de visitar o interessante Museu da Cachaça na vizinha Lagoa do Carro, o maior do gênero no mundo, constando do Livro dos Recordes com uma coleção de mais de 8 mil garrafas.

49. Cachaça de Vitória de Santo Antão - Poucos elementos da cultura brasileira são tão difundidos e apreciados no exterior como a cachaça e a caipirinha, o principal drink dela preparado. A popularidade nacional e internacional da aguardente catapultou a imagem de Vitória de Santo Antão, conhecida como a "Capital da Cachaça", que é um dos principais centros de produção de destilados no país. A fabricação sistemática da cachaça em Vitória teve início em meados do Século XVII, nos antigos engenhos do período açucareiro. Muitos deles, como o Cachoeirinha e o Engenho Velho, são hoje atrações turísticas abertas ao público. Mas a produção de pinga agora acontece em modernas unidades industriais que distribuem o produto para todo o mercado brasileiro e exportam-no para vários países. Nesse contexto enquadra-se a Pitú, surgida em 1938 como uma empresa familiar e que logo se transformou em sinônimo de qualidade e fenômeno de popularidade, sendo a 2ª aguardente mais vendida no mercado nacional, atrás da 51, e chegando a mais de 40 países. Outras atrações de Vitória são o Parque do Monte das Tabocas, no qual foi travada a primeira batalha da Restauração (ver item 41), e o Instituto Histórico e Geográfico da cidade, situado num casarão colonial no Centro.

50. Cachoeiras de Bonito e de São Benedito do Sul - Bonito e São Benedito do Sul estão entre as grandes referências do ecoturismo pernambucano. As cachoeiras são as principais atrações da região. No Bonito Ecoparque estão 8 - Barra Azul, Corrente, Encanto, Humaytá, Pedra Redonda, Tomada do Mágico e Véu da Noiva 1 e 2 -, formadas pelas águas do Rio Verdinho e pelo Riacho Águas Vermelhas, e variando entre 2 e 30m de altura. A mais famosa delas, a Véu da Noiva 1, é também a preferida pelos praticantes de rapel, apresentando 3 quedas d'água e 15 metros de altura. São Benedito do Sul não fica atrás e também conta com 8 cachoeiras - Aritana, Brejinho, Lage, Periperi, Piranji, Poço do Caboclo, Poço do Soldado e Sítio do Cajá. Para se ir até elas é necessário bastante disposição, vez que a média é de 1h de caminhada em região de mata e a distância entre elas varia de 7 a 15 quilômetros. A Pedra do Rodeadouro, também em Bonito, é ideal à prática de cannoying, havendo sido palco do sebastianismo dos membros do Reino do Paraíso Terreal, movimento violentamente sufocado pelo Governo Provincial em 1820.

Os nativos de Paranampuka - Uma análise sobre as etnias do Estado

Quando, em 1500, o português Pedro Álvares Cabral aportou na Bahia, praticamente todo o litoral brasileiro estava ocupado por tribos do grupo Tupi-guarani. Havia meio século, Tupinambás e Tupiniquins tinham assegurado a posse da costa, expulsando para o interior as tribos por eles consideradas "bárbaras", chamadas Tapuias. Entre a foz do Rio Paraíba e a Ilha de Itamaracá, compreendendo os atuais Litorais Sul da Paraíba e Norte de Pernambuco, viviam os Tabajaras, em número de 40 mil, os quais se aliaram aos portugueses. Já os Caetés, mais ou menos 75 mil indivíduos, povoavam a faixa de terra entre a Ilha de Itamaracá e as margens do São Francisco, no Litoral Sul pernambucano e em todo o alagoano. Deglutidores do Bispo Sardinha, foram considerados "inimigos da civilização" e exterminados (ver tópico abaixo). Apesar do grande genocídio em que se traduziu a colonização como um todo, aproximadamente 25 mil remanescentes dos primitivos habitantes de Paranampuka, que em tupi significa "o mar que bate nas pedras", ainda habitam o Estado, espalhando-se pelo interior e constituindo a 4ª maior população indígena do país, atrás apenas das do Amazonas, do Mato Grosso e do Pará.

O triste fim do Bispo Sardinha

De todos os "costumes bárbaros" que possuíam os nativos de Pindorama, nenhum se revelou mais espantoso e odioso aos olhares europeus que o canibalismo. Na Capitania de Pernambuco, o assunto veio à tona de maneira impactante. Em 1556, a caravela que transportava para a Metrópole o 1º Bispo do Brasil, Dom Pero Fernandes Sardinha, naufragou no atual Litoral Sul alagoano, e, após mil peripécias, os cerca de 100 sobreviventes - crianças, adultos e idosos - que alcançaram a praia foram mortos e devorados pelos Caetés, que os aguardavam ansiosos. Apenas 1 português e 2 indígenas que compreendiam o idioma dos nativos conseguiram escapar. O Bispo foi, por assim dizer, o "prato principal" do banquete antropofágico, com sua carne trucidada sendo servida como uma especialidade. Curiosamente, consta que, desde então, o terreno no qual caíra o alto prelado da Igreja tornou-se estéril. A carnificina resultou na violenta perseguição aos Caetés, tradicionais aliados dos franceses e inimigos ferrenhos dos lusitanos, e em sua exterminação no intervalo de 5 anos.

Até hoje, todavia, não há consenso sobre o assunto. Para alguns, a animosidade dos Caetés em relação aos portugueses era notória desde a destruição de sua aldeia Marim pelo donatário Duarte Coelho em 1535, lugar no qual viria a ser fundada Olinda. Empurrados para o Cabo de Santo Agostinho e, dali, cada vez mais para o sul, envolveram-se em inúmeras batalhas com os colonizadores lusos. Há quem defenda, porém, que a atribuição da carnificina aos Caetés foi uma farsa promovida pelos 3 sobreviventes de modo a motivar a perseguição à tribo, senhora das valiosas terras que posteriormente serviriam tão bem à próspera empresa açucareira nordestina. Assim, a autoria da tragédia envolvendo o Bispo recairia sobre os Tupinambás, tradicionais habitantes das terras para além da foz do Velho Chico. O fato é que o episódio chamou a atenção do Velho Mundo para o fenômeno da antropofagia, que tinha a vingança como principal objetivo e era praticada por quase todos os Tupi e Tapuia, com requintes tétricos que disseminaram espanto e horror entre os europeus.

As missões em Pernambuco e a tensão em Cimbres

A análise da História Municipal pernambucana revela que a colonização portuguesa do interior do Estado se deu em duas frentes simultâneas, porém com maneiras de agir distintas. A primeira delas consistiu na expansão dos currais de gado ao longo do Rio São Francisco, de modo a fornecer os animais necessários ao trapiche dos engenhos de açúcar da região, bem como o leite, a carne e o couro que servia de alimento e indumentária à população. Tal empresa foi levada a cabo pelos prepostos e escravos da elite branca e sua atitude em relação aos silvícolas resumiu-se à preação e ao extermínio. Em sentido contrário, foram empreendidas pelos religiosos católicos, em particular pelos da Congregação de São Felipe Néri, presente em Pernambuco desde 1660, missões voltadas à catequese dos nativos, até a principal Ordem missionária (a dos Jesuítas) ser banida em 1759 pelo Marquês de Pombal. De todas as missões estabelecidas pelos frades oratorianos, ao redor das quais se organizariam núcleos urbanos como os de Brejo da Madre de Deus, Limoreiro e Tacaratu, a mais importante foi a Missão do Ararobá, na Serra homônima e voltada à assistência dos índios Xucurus.

A nação Tapuia mais importante do interior do Nordeste era a Cariri, que contava com 22 grandes tribos na região e cerca de 20 mil indivíduos. Suas principais ramificações em Pernambuco eram os Xucurus, na Serra do Ararobá (Pesqueira), os Garanhuns, na Serra homônima, os Carnijós ou Fulni-ôs, no vale do Rio Ipanema (Águas Belas), e os Pankararus, na Serra de Tacaratu. Em volta da capela de Nossa Senhora das Montanhas (1669), fundada pelos oratorianos na Serra do Ararobá, surgiu a povoação de Monte Alegre, futura Vila Real de Cimbres (1762). Cimbres foi um lugar de ensino direcionado aos índios durante mais ou menos dois séculos, contando, inclusive com o famoso "Colégio dos Índios do Ararobá", estabelecimento de ensino profissional. Com o decorrer dos anos, todavia, a outrora garbosa povoação foi entrando em declínio e viu a liderança regional passar à vizinha Pesqueira, localizada no sopé da Serra e, portanto, muito mais acessível. Em 1813, interrompeu-se a assistência aos cerca de 245 xucurus que viviam na Vila, já considerada muito pobre para seguir alimentando-os, e remontam daí os principais conflitos com a tribo, ainda hoje motivo de instabilidade na região.

Em 1879 foi declarado extinto o aldeamento de Cimbres, cessando a tutela governamental sobre os índios, e suas terras foram entregues à Câmara para redistribuição a título de venda ou cessão a terceiros. Em retaliação, os nativos começaram a atritar-se com aqueles que promoveram o esbulho de seus domínios. Num lugar que se orgulha de haver surgido voltando-se à proteção dos silvícolas, persiste a vergonhosa situação de a demarcação das terras daqueles nunca haver sido efetuada. Tal demarcação vem sendo sistematicamente pleiteada desde 1980, bem como violentamente repreendida pelos cerca de 280 fazendeiros da região, havendo resultado em quase 30 mortes, dentre as quais a do famoso Cacique Chicão. A guerra local certamente não preocuparia tanta gente não houvesse sido a adormecida Cimbres o lugar de aparição de Nossa Senhora em 1936, um dos únicos 5 no mundo reconhecidos pelo Vaticano, razão pela qual muitos fiéis para lá se dirigem. A crise é tamanha que, prevendo os problemas com a tribo, a Prefeitura de Pesqueira criou uma pequena réplica do Santuário ainda no sopé da Serra, de modo a satisfazer os visitantes e evitar os possíveis problemas da aproximação com a ressentida etnia.

As etnias remanescentes

Hoje em dia, existem legalmente em Pernambuco 7 grupos indígenas, apesar de serem 10 as etnias remanescentes dos Cariris. As 7 são os Xucurus (Pesqueira), os Fulni-ôs (Águas Belas), os Kapinawás (Buíque), os Pankararus (Petrolândia e Tacaratu), os Kambiwás (Ibimirim, Inajá e Floresta), os Atikuns (Carnaubeira da Penha) e os Trukás (Cabrobó). As outras 3 são os Tuxás (Inajá), os Pankarás (Itacuruba) e os Pipipãs (Floresta). Após anos de contato e de miscigenação com o homem branco e negro, num longo processo de aculturação, as tribos se descaracterizaram, mas traços de sua cultura foram precariamente preservados e em seus membros persiste o sentimento de identidade indígena. As tradicionais figuras do cacique e do pajé ainda sobrevivem, bem como o toré é dançado em todos os grupos. Apenas os Fulni-ô, todavia, conservaram o idioma tribal. A maioria vive da agricultura de subsistência e do rico artesanato, exposto no Museu do Índio do Nordeste (MINNE), em Arcoverde (centro geográfico das etnias do Estado), o 2º mais importante do gênero no país, bem como no Museu do Homem do Nordeste da FUNDAJ.

As duas maiores etnias são a dos Xucurus e a dos Pankararus, com cerca de 3.500 indivíduos cada. Alvo das missões ao tempo da Colônia, professam a fé católica e vivenciam eventos religiosos, como a Festa de Nossa Senhora das Montanhas (Xucurus). É nessas oportunidades, porém, que manifestam suas tradições. Os Pankararus também celebram sua cultura nas reservadas festas do Menino do Rancho e do Flechamento do Umbu. Os Kapinawás, por sua vez, habitam o Parque Nacional do Vale do Catimbau, repleto de lendas e de misticismo. A etnia mais interessante, todavia, é a dos Fulni-ôs. É que eles são os únicos do Nordeste que mantêm viva sua língua, o yathê, transmitida oralmente e por intermédio de uma escola bilíngue que há na reserva. Além da aldeia, a comunidade possui um outro local de moradia, no qual passa os 3 meses do ano em que ocorrem os misteriosos rituais do Ouricuri, espécie de retiro relioso. Além do toré, dançam a cafurna e o côco de roda e possuem um Centro Fitoterápico de Reprodução de Mudas e Essências Medicinais, mantido com o apoio da Fundação Nacional da Saúde e da UNESCO e no qual são cultivadas várias plantas que servem à medicina natural.

A toponímia legada pelos silvícolas

Volta e meia os pernambucanos se deparam com vocábulos de origem indígena, tanto tupi-guarani quanto tapuia-cariri. O imenso legado dos primeiros povoadores do Estado em que "o mar bate nas pedras", possivelmente nos arrecifes que batizaram a Capital, faz-se sentir, por exemplo, nas denominações de acidentes geográficos e de Municípios. Assim é que Araripe significa "serra das cabeceiras", Beberibe "rio das raias", Borborema "região desabitada", Cabrobó "guerra", Capibaribe "rio das capivaras", Caruaru "rio das caruaras, moléstia que ataca o gado", Exu "abelha que faz ninho rugoso", Garanhuns "os pássaros pretos", Goiana "porto do vale", Gravatá "caroá rijo", Guararapes "nos tambores", Itamaracá "pedra que canta", Igarassu "canoa grande", Ipojuca "rio de águas pútridas", Jaboatão "mão firme como a do jaguar", Ouricuri "árvore que dá vários cachos", Pajeú "rio do feiticeiro", Suape "caminho da caça", Sirinhaém "bacia de siris", Tacaratu "furna não muito profunda" e Tamandaré "que se assemelha ao tamanduá".

quarta-feira, 17 de março de 2010

100 coisas para não perder em Pernambuco - Parte 4

31. Carnaval de Olinda - "Olinda, quero cantar a ti esta canção". Basta alguém entoar os famosos versos do Hino do Elefante, denominação oficial da canção que, de tão popular, já foi aclamada como hino da própria Olinda, para a multidão em coro, espremida pelas ruas do Sítio Histórico Patrimônio da Humanidade, cantar emocionada. De todos os mundialmente famosos eventos momescos brasileiros, o de Olinda é, sem dúvida, o mais autêntico Carnaval de rua e, por isso mesmo, o mais popular. Apesar de legado pelos portugueses, é como o conhecemos hoje um evento relativamente recente, remontando ao início do Século XX e coincidindo com o surgimento das primeiras agremiações, algumas das quais ainda desfilam. O grande destaque, todavia, cabe aos famosos bonecos gigantes, herança européia que tem suas origens nas procissões do Século XV, quando bonecos acompanhavam os cortejos. Desde que o Homem da Meia-Noite, o primeiro, saiu às ruas em 1932, novos personagens vêm sendo criados a cada ano e hoje eles já somam mais de 100. Na Terça-Feira Gorda acontece, entre os Largos de Guadalupe e do Varadouro, o encontro de todos, um dos pontos altos da festa olindense.

32. Olinda Arte em Toda Parte e MIMO - Não foi por acaso que, quando o título de "Capital Brasileira da Cultura" foi criado em 2006, Olinda teve a honra de ser escolhida como a 1ª, desbancando fortes concorrentes como Salvador, a 1ª Capital da Colônia, e João Pessoa. Intimamente ligada à História do país, a cidade consegue aliar paisagem exuberante, rico patrimônio histórico e artístico e imensa riqueza cultural. Para se ter uma idéia, é lá que está a maior concentração de artistas por m² do Brasil, mais de 400, alguns de renome internacional como João Câmara, Tereza Costa Rego e Guita Charifker. Todos os anos eles abrem as portas de seus ateliês, cerca de 70, e convidam os visitantes a conhecer seu trabalho, dando ensejo ao ímpar Olinda Arte em Toda Parte. E o fascínio da antiga Marim dos Caetés não para por aí. Nascida em 2004, a excelente Mostra Internacional de Música põe em diálogo a mais conceituada música erudita mundial com o melhor da música popular brasileira, tudo isso no seio das coloniais e barrocas igrejas de perfeita acústica. Mais uma vez, as íngremes ruas da jóia arquitetônica mundial são tomadas pela multidão, que chega atraída pelas apresentações dos virtuosi.

33. Veneza Water Park - Inaugurado em 1999 entre o rio e o mar, no exuberante Pontal de Maria Farinha (Paulista), centro do maior pólo de lazer e esportes náuticos do Norte/Nordeste (ver item 39), o Veneza Water Park é um dos maiores e melhores parques aquáticos do país, com 90 mil m² de área totalmente destinados à diversão e ao lazer. A 30km do Centro do Recife, o Veneza dispõe de diversas atrações que comportam mais de 10 milhões de litros de água. Entre elas estão uma torre com 8 toboáguas das mais variadas formas e cerca de 30m de altura, o maior rio lento do Brasil, uma gigantesca piscina com ondas artificiais e a “Anaconda”, um toboágua em forma de serpente enrolada em uma arvore centenária. Outro ponto forte do Parque é a gastronomia. O restaurante Galeão, réplica de um navio holandês do Século XVII, é puro charme. Há ainda uma Praça de Alimentação com uma grande variedade de fast-foods e bares em estilos bem variados, como o Bar da Praia, que, além de estar localizado à beira mar e servir ao público externo, oferece música ao vivo todos os domingos e feriados. Imperdível!

34. Ilha de Itamaracá - Itamaracá está entre os mais antigos focos de colonização portuguesa no Brasil (1491), antes mesmo da "descoberta" cabralina da Colônia. Quando o donatário Duarte Coelho aportou no Canal de Santa Cruz, que a separa do continente, fez fincar um marco na fronteira de sua Capitania (Pernambuco) com a de Itamaracá, marco este que atualmente se encontra em exposição no Instituto Histórico, Arqueológico e Geográfico do Estado. A Capitania não vingou, sendo posteriormente integrada à próspera vizinha, mas Itamaracá ainda guarda resquícios desses áureos dias. Vila Velha, a antiga Capital, foi fundada quase 10 anos antes de Igarassu e Olinda, em 1526, quando ali se ergueu a primitiva Igreja da Conceição. Em 1631 os holandeses construíram o Forte Orange, assim chamado em homenagem aos fidalgos da Casa de Orange, governadores dos Países Baixos e parentes do Conde Maurício de Nassau. Mas nem só de história vive Itamaracá. A Ilha respira ecologia, com destaque para o imperdível Centro de Mamíferos Aquáticos do IBAMA (Centro Peixe-Boi), que trabalha arduamente para salvar a espécie da ameaça de extinção. São mais de 10 belas praias, porém a mais famosa é, sem dúvida, a badalada Ilhota Coroa do Avião (travessia de barco a partir da Praia do Forte, ver item 39), que na verdade está situada no Município de Igarassu.

35. Ciranda de Itamaracá - "Eu vou com meu amor para a Ilha de Itamaracá, vou dançar uma ciranda que a Lia mandou chamar". Basta a Rainha Lia mandar chamar para os cirandeiros de Itamaracá, que em tupi curiosa e acertadamente significa "pedra que canta", acudirem. De mãos dadas, uma grande e democrática roda é formada por gente de todos os tipos, que movimenta o corpo simulando o movimento das ondas do mar. Girando à direita, com os braços e pés em movimentos graciosos, todos ondulam os seus sonhos acompanhando as canções tiradas pela Mestre Cirandeira, que entoa acompanhada de uma pequena orquestra. Não se sabe ao certo a origem da ciranda, se foi legada pelos portugueses ou se é criação dos pescadores brasileiros, mas a evidência é que o seu aparecimento se deu em Pernambuco, tanto na região litorânea quanto na Mata Norte. E em Itamaracá, a "Terra da ciranda", o reinado de Maria Madalena Correia do Nascimento (nasc. 1944) é inconteste. O jornal The New York Times a chamou de "diva da música negra". O francês Le Parisien comparou sua voz à da cabo-verdiana Cesária Évora. No Brasil, críticos de música comparam-na a Clementina de Jesus. Verdadeira lenda viva da música brasileira, Lia segue a encantar o Brasil e o mundo, fazendo a fama da Ilha.

36. Centro Histórico de Igarassu - Berço da pernambucanidade, Igarassu orgulha-se de ter sido o lugar onde o donatário Duarte Coelho primeiro pisou ao aportar em terras brasileiras. Foi na atual Praia dos Marcos, no longínquo ano de 1535, que a comitiva do fidalgo desembarcou, rumando para o sul e ali erguendo a Igreja dos Santos Cosme e Damião, a mais antiga em funcionamento do país. De Igarassu ele partiu para Olinda, onde se estabeleceu definitivamente. A pequenina cidade, com um dos conjuntos arquitetônicos mais importantes do país, é pura história. Outros de seus destaques são a Igreja e Recolhimento do Sagrado Coração de Jesus, o Museu Histórico e Casa da Câmara e Cadeia, todos do Século XVIII, e esta última com a curiosidade de possuir Santo Antônio como Vereador perpétuo. Mas a jóia rara de Igarassu é o Convento de Santo Antônio (1588), o 3º da Ordem Franciscana no Brasil. É que ele alberga uma das mais importantes coleções de arte colonial brasileira do mundo, com 24 pinturas e painéis dos Séculos XVII e XVIII na ótima Pinacoteca. A quem interesse, há ainda a possibilidade de passear de catamarã pelos manguezais da região e, de quebra, visitar as Ilhas de Itamaracá e da Coroa do Avião.

37. Centro Histórico de Goiana - Depois de Olinda e de Igarassu, Goiana conserva o centro histórico mais importante do Estado. A região começou a ser povoada em 1570, impulsionada pela empresa açucareira. Em pleno desenvolvimento, chegando inclusive a sediar a Capitania de Itamaracá, foi alvo da cobiça estrangeira, pelo que foi palco de um sem número de batalhas contra os franceses e holandeses, com destaque para o célebre episódio das "Heroínas de Tejucupapo", um grupo de mulheres que, em 1646, armadas com paus, pedras, panelas, pimenta e água fervente, derrotaram mais de 300 flamengos. O fato é revivido anualmente em uma encenação realizada pelo Clube das Mães no Distrito de Tejucupapo. Os principais edifícios históricos de Goiana são as Igrejas do Rosário dos Pretos (1596), do Carmo (1666) e do Rosário dos Brancos (1701), mas ao todo elas somam mais de 10, abrangendo os estilos colonial, maneirista e barroco. Os antigos Engenhos complementam o roteiro, com destaque para os charmosíssimos Uruaé, onde viveu o Conselheiro João Alfredo, e Bujari, ambos do Século XVII. Goiana também é a terra do famoso artista Zé do Carmo, que, através da pintura e da escultura, transforma em anjos personagens típicos nordestinos, como os cangaceiros.

38. Buraco da Gia - De passagem por Goiana, não deixe de visitar o Restaurante Buraco da Gia. Apesar do nome, no lugar não há um só desses anfíbios. Lá o brilho fica por conta dos caranguejos de Luiz Moraes, que, com suas imensas patas, atraem e encantam, bem como às vezes afugentam, os visitantes. Adestrados por Seu Luiz, eles são capazes de segurar e de quebrar um copo, de puxar carrinhos com 4 cervejas e de abrir garrafas, tudo ao simples comando do mestre. Nomes como Juscelino Kubistcheck, Gilberto Freyre, Assis Chateaubriand, Chacrinha e Jarbas Vasconcelos já participaram do chamado "Show do Caranguejo", no qual Seu Luiz ordena seus guaiamuns a segurarem o copo enquanto o cliente bebe cerveja ou refrigerante. Ao final, os atrópodes ainda esboçam um pequeno gesto de agradecimento. O Buraco já foi matéria de várias revistas e jornais nacionais e internacionais, como o The New York Times. Com seus guaiamuns e caranguejos, Seu Luiz também já participou de programas de televisão como Hebe, Silvio Santos, Domingão do Faustão e os extintos Chacrinha e Que Delícia de Show, apresentado por Flávio Cavalcanti. Absolutamente inacreditável!

39. Praias do Litoral Norte - Del Chifre, Milagres, Carmo, Farol, Bairro Novo, Casa Caiada e Rio Doce (Olinda); Enseadinha, Janga, Pau Amarelo, Ó, Conceição e Maria Farinha (Paulista); Gavoa, Capitão, Marcos e Coroa do Avião (Igarassu); Forte/São Paulo, Forno da Cal, Rio Âmbar, Baixa Verde/Currupio, Pilar, 4 Cantos, Jaguaribe, Pontal de Jaguaribe, Sossego/Lance dos Cações, Fortinho/Enseada dos Golfinhos e Pontal da Ilha (Itamaracá), Atapuz, Catuama, Barra de Catuama, Tabatinga, Ponta de Pedras e Carne de Vaca (Goiana). Muitas são as praias do belo Litoral Norte pernambucano, mas as mais baladadas são mesmo Maria Farinha e a Coroa do Avião. Situada entre o rio e o mar, Maria Farinha é nacionalmente conhecida por suas águas rasas e calmas e pelos vários esportes náuticos e passeios de ultraleve que ocorrem em seus domínios. Já a paradisíaca Ilhota Coroa do Avião é, na verdade, um banco de areia surgido em 1980 por força das correntes marinhas, contando com diversos bares à beira mar e abrigando a Estação de Estudos sobre Aves Migratórias da UFPE.

40. Novo Aeroporto - Ao desembarcar no Recife, o visitante já se depara com um dos motivos de maior orgulho dos pernambucanos. O belíssimo novo Aeroporto Internacional dos Guararapes/Gilberto Freyre, projetado por Ubirajara Moretti, é referência em soluções arquitetônicas, conjugadas a sistemas com tecnologia de ponta. O edifício do Terminal de Passageiros é uma lâmina de 270m por 70m de largura, com o conector e as pontes de embarque voltados para o pátio de aeronaves. O Edifício-garagem, com geometria perimetral em níveis escalonados de baixo para cima, possui efeito de esplanada, com vegetação nas bordas, e evidencia a Praça Salgado Filho, projetada por Burle Marx (ver item 21). Concebido sob o conceito dos modernos Aeroshoppings, o Terminal do Aeroporto é ricamente decorado com obras dos conceituados artistas locais Abelardo da Hora, Francisco Brennand, João Câmara, José Cláudio, Gil Vicente e Pedro Frederico, dando uma idéia da dimensão que tem a nossa Nação Cultural. Se o pernambucano é, por natureza, um apaixonado por seu rincão, o anseio de voltar para casa não poderia ser melhor estimulado.

segunda-feira, 15 de março de 2010

100 coisas para não perder em Pernambuco - Parte 3

21. Circuito Burle Marx - Recife tem o privilégio de contar com 10 espaços públicos concebidos pelo conceituado paisagista Roberto Burle Marx, descendente de pernambucanos, que esteve à frente dos Parques e Jardins do DAU/Pernambuco entre 1934 e 1937. São de sua autoria as Praças de Casa Forte, do Derby, do Entroncamento, Euclides da Cunha (do Internacional), Faria Neves (de Dois Irmãos), da Oficina Brennand (ver item 24), da República (ver item 4) e Salgado Filho (do Aeroporto), bem como os jardins do entorno da Capela da Jaqueira e dos edifícios da CELPE e da SUDENE. A primeira e mais famosa criação do gênio no Recife foi a Praça de Casa Forte, com 3 jardins que englobam um lago central com plantas aquáticas amazônicas, dentre as quais as famosas vitórias-régias. A mais polêmica, todavia, foi a Praça Euclides da Cunha, coerentemente ornamentada com cactáceas do Sertão, o que despertou fulminante reação conservadora capitaneada por Mário Melo, acusando o expoente do paisagismo internacional de devolver o Recife à barbárie. Burle Marx, por seu turno, alegou tentar livrar os "jardins do cunho europeu", semeando a "alma brasileira" e divulgando o "senso de brasilidade".

22. Bolo de rolo da Casa dos Frios - Não se sabe ao certo a origem desta iguaria produzida com massa de pão de ló, tão fina quanto fofa, e recheio de goiabada. Ao que tudo indica, porém, foi com a vinda da Corte em 1808 que a original receita portuguesa do "Colchão de noiva" chegou em terras pernambucanas, com a européia pasta de amêndoas dando lugar ao tropical doce de goiaba. Nascia então o bolo de rolo, declarado Patrimônio Cultural e Imaterial de Pernambuco em 2008 - mais que a cara, o sabor do Estado. Desde 1970, a Casa dos Frios comercializa pioneiramente sua versão mais famosa, seguindo fielmente as orientações traçadas por Fernanda Dias e Ana Maria Soares. Nem mesmo o Papa João Paulo II, em sua visita ao Recife em 1980, resistiu à gulodice produzida pelo empório cinquentão. Ao longo dos anos, surgiram as versões de ameixa, amêndoa, chocolate, doce de leite, maracujá e nozes. Além de ser vendido nas duas unidades da empresa (Graças e Boa Viagem), o quitute pode ser encontrado em um Quiosque 24h no Aeroporto. Uma delícia!

23. Instituto Ricardo Brennand - Em terras que no passado pertenceram ao herói da Restauração João Fernandes Vieira, o industrial e mecenas Ricardo Brennand inaugurou, no ano de 2002, o Museu do Instituto homônimo, reunindo as impressionantes obras de arte que ele vem colecionando há mais de 50 anos. Instalado em um complexo de castelos medievais, o magnífico Instituto, citado na obra "1000 lugares para conhecer antes de morrer" e contando com personalidades como Nélida Piñon e Bia Corrêa do Lago na equipe, é centro de referência no estudo do Brasil holandês, reunindo na Pinacoteca, dentre outras preciosidades, a maior coleção privada de obras do pintor flamengo Franz Post, formada por 17 quadros representativos de todas as fases de seu trabalho. A Holanda, aliás, reconhecendo que o IRB utilizava tecnologia de ponta no tratamento de seu acervo, permitiu que a exposição "Albert Eckhout volta ao Brasil (1644-2002)" viesse ao Recife, situando o Estado na rota das grandes mostras internacionais. A estátua de "O Pensador", uma das únicas 12 reproduções do original executadas pelo próprio Rodin, a exposição de bonecos de cera "O Julgamento de Fouquet" e a coleção de armas brancas no Castelo de São João, também a maior particular do mundo, são outros destaques do imperdível Instituto.

24. Oficina Francisco Brennand - A Oficina Brennand surge em 1971 nas ruínas de uma olaria do início do Século XX como materialização do projeto obstinado e sem trégua do famoso artista plástico Francisco Brennand. Recanto único no mundo, também citado no livro "1000 lugares para conhecer antes de morrer" e cercado por remanescentes de Mata Atlântica e pelas águas do Capibaribe, o ateliê, fonte inspiradora e depositária da história do gênio pernambucano, consiste num conjunto arquitetônico monumental de grande originalidade, em constante processo de mutação, no qual a obra se associa à arquitetura para dar forma a um universo abissal, dionisíaco, subterrâneo, obscuro, sexual e religioso. A presença do artista, num trabalho contínuo de criação, confere ao lugar um caráter inusitado, identificando-o como uma instituição intrinsecamente viva e com uma dinâmica que torna imprevisíveis os rumos do espaço e da obra. A Oficina ainda conta com uma Praça de autoria do ótimo Burle Marx (ver item 21) e com uma Capela projetada pelo premiado arquiteto brasileiro Paulo Mendes da Rocha, Pritzker de Arquitetura.

25. Complexo de Salgadinho - Na histórica e estratégica região entre os Municípios de Olinda e Recife, ao lado da antiga Fábrica Tacaruna (futura Fábrica Cultural), ergue-se o maior complexo de negócios, lazer e entretenimento do Estado. O grande destaque do conjunto cabe ao arrojado e gigantesco Centro de Convenções (1976), em estilo racionalista, o 3º maior do país. O CECON recebe os grandes eventos do Estado, como a Feira de Artesanato FENEARTE, sempre em julho, considerada a maior do tipo na América Latina, e o prestigiado Festival do Audiovisual CINE PE. Ao seu lado estão o Parque Mirabilândia (de diversões) e o Chevrolet Hall, erguido em 2001 como a maior casa de shows do Brasil. Do outro lado da Av. Agamenon Magalhães encontra-se o Shopping Tacaruna, o principal centro de compras da Zona Norte, e, no alargado canteiro central do Complexo, o Espaço Ciência, maior museu a céu aberto do país e um dos maiores do mundo, com atrações como um planetário, uma hidrelétrica gerando corrente, um vulcão em atividade e a sensação de um terremoto, ideal para se ir com a criançada.

26. Rota dos naufrágios - Em 1887, os Vapores Pirapama e Bahia colidiram na altura da Praia de Ponta de Pedras (Goiana), causando a morte de 37 tripulantes e dando ensejo a um dos piores desastres navais de que se tem notícia no Brasil. O Bahia naufragou na ocasião, mas o Pirapama conseguiu escapar e partiu sem prestar socorro. Irreversivelmente avariado, foi, porém, afundado 2 anos depois, a 6 milhas do Porto do Recife. Hoje, encontra-se a 23 m de profundidade e é habitado por grandes tartarugas, arraias, moréias e por uma imensa variedade de espécies marinhas, constituindo um dos naufrágios mais bonitos e freqüentados da costa pernambucana. Sim, um dos porque há muitos outros, mais de 100, segundo consta, sendo 12 demarcados e operáveis. Não por outra razão o Recife é conhecido pelos mergulhadores como a "Capital brasileira dos naufrágios", alguns ainda intocados e adormecidos no tempo, repletos de lendas sobre a existência de tesouros, jóias e tudo aquilo que a imaginação lhes possa atribuir. A experiência pode ser vivida por qualquer pessoa com mais de 12 anos de idade mediante um curso de mergulho acompanhado.

27. Arte de Romero Britto - Filho de uma família carente do Recife, o artista autodidata Romero Britto, nascido em 1963, começou sua carreira vendendo naturezas-mortas em feiras populares. Imigrou para os Estados Unidos em 1990 e hoje é o artista plástico brasileiro mais bem-sucedido no exterior. Já fez pinturas para uma campanha simbólica da vodca Absolut, criou latinhas para a Pepsi e redesenhou personagens da Disney a convite da empresa. Britto também conquistou uma legião de clientes famosos, da cantora pop Madonna ao ex-Presidente americano Bill Clinton. Suas obras transpiram alegria. Ele retrata um mundo onde a felicidade e a serenidade imperam: há casais dançando, gatinhos sorrindo, peixes voadores saltando à toa, flores desabrochando e amantes se beijando. Para atingir emoções tão delicadas, criou sua própria linguagem pictórica, atualmente chamada pela crítica de "Novo Cubismo Pop". Com cores brilhantes, formas harmoniosas e desenhos agradáveis, sua arte precisa ser absorvida em termos próprios. Pernambuco homenageia o filho ilustre expondo a obra "Bola de praia" no Aeroporto.

28. Sítio Histórico de Olinda (UNESCO) - "Oh, linda situação para se construir uma vila", haveria exclamado o donatário Duarte Coelho ao avistar a colina na qual se encontrava a antiga aldeia Marim dos índios Caetés. Ali fez erguer, em 1535, aquela que viria a ser a Capital de sua Nova Lusitânia, a Capitania mais próspera da nascente Colônia, fundada no promissor comércio do açúcar. Quase tão antiga quanto o Brasil, Olinda, destruída e subjugada pelos holandeses em 1631 e reconstruída em 1654, acompanhou o desenvolvimento de seu antigo porto, o Recife, e, não de bom grado, viu-o assumir a função de Capital. Assim, todavia, pôde manter-se afastada dos malefícios do progresso econômico e do crescimento desenfreado, conservando o belo casario colonial que, em 1982, foi alçado à condição de Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade pela UNESCO. Suas construções mais célebres, obras-primas da arquitetura colonial portuguesa no ultramar, são, em ordem antiguidade, a Catedral (1535) e as Igrejas da Misericórdia (1540), da Graça/Seminário (1545) e do Carmo (1588), além do Convento de São Francisco (1585) e do Mosteiro de São Bento (1599). Também merecem destaque os Museus de Arte Contemporânea e do Mamulengo, o Mercado da Ribera e as Ruínas do Senado da Câmara, de onde Bernardo Vieira de Melo haveria dado, em 1710, o primeiro grito de República no Brasil. Linda, realmente, absurdamente linda...

29. Tapioqueiras do Alto da Sé - Olinda nasceu na Sé, no topo da colina onde, já em 1535, Duarte Coelho fez erguer a Igreja de São Salvador do Mundo, futura Catedral Arquidiocesana, hoje abrigando o corpo do famoso arcebispo emérito Dom Hélder Câmara. É de lá, do Alto, que de se descortina uma das mais belas vistas das cidades-irmãs: a colonial e ajardinada Olinda ergue-se soberba em primeiro plano, contemplando orgulhosa, ao fundo, o progresso de sua pujante filha, uma metrópole contemporânea e verticalizada. A Catedral enfrentou várias reformas ao longo dos anos, já tendo tido, inclusive, um aspecto gótico. Defronte a ela, no fim de tarde, dezenas de tapioqueiras se enfileiram lado a lado para preparar essa iguaria local, das mais apreciadas pelo paladar pernambucano. Tudo é feito em um rústico braseiro de carvão e há diversas opções de recheio: o clássico coco com queijo e manteiga, carne-de-sol, camarão, frango com catupiry, presunto com queijo, além de cartola (banana com queijo, açúcar e canela), doce-de-leite ou Romeu e Julieta (goiabada com queijo). É só escolher e se deliciar!

30. Canto gregoriano no Mosteiro de São Bento - Erguido em 1599, São Bento de Olinda foi o 2º mosteiro beneditito em terras brasileiras. Incendiado pelos holandeses em 1631, foi restaurado em 1654 e, em 1827, passou a abrigar a recém-criada Faculdade de Direito de Olinda (ver item 14), a 1ª do Brasil. Seu magnífico altar-mor (1786), um dos exemplares mais belos e significativos da talha dourada no país, já foi exposto como atração principal da exposição "Brasil de Corpo e Alma" no Museu Guggenheim de Nova Iorque, para onde foi transportado após ser desmontado. Mas a grande atração do Mosteiro são mesmo os cantos gregorianos entoados pelos monges todos os domingos, na missa das 10h. Essa antiga forma de cantar, com ritmo livre e sem métrica, fascina as pessoas há séculos por sua simplicidade e entonação em uníssono, que transmitem calma e relaxamento. As letras são solfejadas em um idioma em desuso - o latim - e seu teor é sacro e cristão. Os monges de Olinda são tão afinados e fazem tanto sucesso que até já gravaram CD e são constantemente convidados a se apresentar no exterior.

domingo, 14 de março de 2010

Antes mesmo de Paranampuka - Notas sobre a Pré-história pernambucana

Apesar do árduo trabalho levado a cabo pelos arqueólogos, em especial da UFPE, da UNICAP e da UNIVASF em Pernambuco, um abismo de incompreensão ainda turva o que se sabe sobre período pré-duartino, isto é, anterior à chegada do donatário Duarte Coelho para tomar posse de sua Capitania, em 1535. A própria origem de nossos mais remotos ancestrais ainda não pôde ser satisfatoriamente esclarecida, com a tradicional teoria sobre a migração glacial via Estreito de Behring, há cerca de 12 mil anos, caindo por terra ante os novos indícios, encontrados pela pesquisadora Niède Guidon na Toca do Boqueirão (Serra da Capivara, Piauí), de que os paleoíndios possam ter aqui chegado há pelo menos 50 mil anos pela via marítima, após cruzarem o Pacífico. A datação das cinzas desenterradas em São Raimundo Nonato, mediante a inquestionável técnica do carbono 14, atribuiu-lhes 48 mil anos de idade, mas sobre elas paira a tese de que, ao invés de reportarem a fogueiras feitas por caçadores primitivos, correspondem a resquícios de queimadas naturais.

Tesouros de giz na Chapada do Araripe

O palco geológico de maior destaque no Estado é a Chapada do Araripe, com 8 mil km² de superfície e uma altitude média de 600m na divisa com o Ceará, consistindo em um dos principais sítios do Período Cretáceo do mundo. A região é especial pelos achados geológicos e paleontológicos desde os primeiros anos do Século XIX, com registros entre 110 e 70 milhões de anos, em excepcional estado de preservação e diversidade. No Araripe está mais de um terço de todos os registros de pterossauros descritos no mundo, mais de 20 ordens diferentes de insetos e a única notação da interação inseto-planta. Há similares destas mesmas espécies na África, vestígio de quando os continentes foram um só, formando a primaz Gondwanna (cerca de 36% do território brasileiro é constituído por marciços antigos que fizeram parte do supercontinente). Os fósseis da "Formação de Santana", um dos setores geológicos da Bacia do Araripe mais ricos em vestígios de peixes, evidenciam a época em que o Sertão era um imenso mar continental, entre 112 e 99 milhões de anos atrás.

Ao lado de muitos outros documentos fósseis, os do Araripe, em especial os de Santana, dão uma contribuição importante à Teoria da Evolução de Darwin sobre o ritmo dos acontecimentos na evolução biológica, hoje em estreita sintonia com a pesquisa genética mais avançada. Assim, curiosamente põem em xeque o Criacionismo numa região fortemente marcada pelas demonstrações de fé católica concentradas da figura do Padre Cícero do Juazeiro. Nos diversos sedimentos da Formação são encontrados vestígios de peixes, crustáceos, tartarugas, rãs, insetos, sáurios da terra e do ar, únicos no mundo inteiro, bem como maravilhosas plantas. A conservação de partes moles, como a pele de vôo de sáurios e seu conteúdo estomacal, não encontra paralelo. Além dos sedimentos do Cretáceo, também existem depósitos jurássicos mais antigos, como troncos fossilizados de árvores. Há ainda sítios arqueológicos que atestam uma ocupação humana do período neolítico (utensílios de pedra, cerâmica, pinturas rupestres, já com 5 a 7 mil anos).

A região, Pólo Gesseiro do Estado, respondendo por 95% da produção de gipsita no país, abriga atualmente o único geopark das Américas, o Geopark Araripe, aprovado e oficializado pela UNESCO em 2006 e formado por uma rede de 9 parques de proteção e preservação de registros geológicos, paleontológicos e paisagens naturais. Lá também está o excelente Museu de Palentologia da URCA, em Santana do Cariri (CE). A criação do Geopark e do Museu, bem como a atuação preventiva e repressiva da Polícia Federal, ajudou a inibir o contrabando internacional de fósseis nesta que é a maior reserva brasileira do tipo. Os “peixeiros”, como são conhecidos aqueles que exploram e comercializam clandestinamente os vestígios, a preços entre R$ 40 e 1.000 por peça, vendem-nos a atravessadores que os distribuem ao Primeiro Mundo, razão pela qual apenas 40% dos restos arqueológicos descobertos na Chapada permanecem no Brasil. Muitos deles estão em museus europeus e são reivindicados pelo Governo Federal.

Pré-história e misticismo no Vale do Catimbau

Controvérsias à parte, o certo é que há mais ou menos 12 mil anos, durante a transição entre os períodos Pleistoceno e Holoceno, boa parte do território brasileiro já estava ocupado por grupos de caçadores e coletores pré-históricos. Tais grupos são divididos pelos arqueólogos em tradições, estabelecidas de acordo com os resquícios de sua cultura material. À tradição Nordeste pertenciam aqueles que possuíam indústria lítica refinada e faziam belas pinturas rupestres. Há mais ou menos 7 mil anos atrás, esse grupo foi substituído pelas tribos da tradição Agreste, que não dominava as artes, exceto a da guerra. É a esse período de transição que remonta a presença humana mais antiga de que se tem notícia no Parque Nacional do Vale do Catimbau, o 2º maior parque arqueológico do Brasil, perdendo apenas para a Serra da Capivara, no Piauí. Em 1970 foi descoberto um esqueleto datando 6.800 anos em um abrigo utilizado como cemitério pré-histórico, atualmente em exposição no Museu Municipal de Buíque.

Com uma superfície de 90 mil ha, o Vale do Catimbau estende-se entre os Municípios de Buíque, Ibimirim, Inajá e Tupanatinga, fazendo fronteira com a reserva indígena federal Kapinawá, localizada na serra da Mina e onde vivem cerca de 400 índios. Primeiro Parque Nacional terrestre de Pernambuco e uma das oito unidades federais de conservação que preservam o bioma da Caatinga, é cortado por dezenas de trilhas que revelam elementos naturais exóticos e surpreendentes, em razão dos quais sempre esteve associado ao místico e ao sobrenatural. Suas formações geológicas constituem um verdadeiro espetáculo visual, com composições areníticas oscilando entre 50 colorações, as quais datam de mais de 100 milhões de anos, e rochas cujos formatos sugerem a silueta de animais, pessoas e construções, como a Pedra do Cachorro, a do Elefante (próxima à reserva indígena) e a Serra das Torres. Na Vila do Catimbau, a Associação dos Guias disponibiliza profissionais aptos a acompanhar e orientar os visitantes durante o passeio.

Segundo pesquisadores da UFPE, os antigos habitantes do lugar eram grupos caçadores-coletores do Período Holoceno que não apresentavam domínio da cerâmica e moravam em cavernas (tanto é que, das cerca de 200 grutas e cavernas existentes no Vale, pelo menos 28 guardam vestígios de sepultamentos). Dos 23 sítios arqueológicos com grafismos rupestres já catalogados pelo IPHAN no Parque, o maior e mais importante é o Alcobaça, situado em um paredão rochoso com configuração de anfiteatro. Lá foram encontradas pinturas rupestres em um painel de 60m, ocupando uma área de 50m de extensão com largura variando entre 2 e 3m. Já a pedra da Concha apresenta um painel de 2,3m por 1,5m, albergando inscrições com figuras humanas, animais e desenhos geométricos em tons ocre. São imagens isoladas que não compõem cenas, com predominância da tradição Agreste. Acredita-se que foram utilizados nas pinturas pigmentos metálicos e não metálicos misturados a pigmentos orgânicos, como genipapo e urucum.

Cemitérios arqueológicos na Furna do Estrago

Escavada pelos arqueólogos da UNICAP, a Furna do Estrago, abrigo sob rocha localizado no Município de Brejo da Madre de Deus, é um dos mais importantes sítios arqueológicos do Brasil. Formado pelo desabamento de um grande bloco de rocha granítica no sopé da Serra da Boa Vista durante as glaciações, o abrigo foi preenchido por blocos de rocha e sedimentos soltos pelo intemperismo físico, transportados em violentas precipitações torrenciais. Constituído por um único salão de 125m² de área coberta, com abertura voltada para nordeste, o abrigo é bastante arejado, seco e iluminado, e diante dele se estende um patamar delimitado por grandes blocos de rocha granítica, alguns contendo arte rupestre. Da sucessiva utilização do sítio como habitação por grupos caçadores-coletores numa seqüência temporal de aproximadamente 10 mil anos, resultou uma estratigrafia em que predominam as lentes de fogueiras superpostas, formando pacotes de cinzas, e sedimentos finos, soltos, secos, de cor parda, contendo restos alimentares e toscos artefatos de pedra e osso.

Há cerca de 2 mil anos, a Furna passou a ser utilizada como cemitério. Os depósitos feitos pelo homem desde o início do Holoceno foram intensamente perturbados com a abertura de dezenas de fossas funerárias. Apenas uma área próxima do fundo do abrigo permaneceu intacta e foi tomada para estudos. Da ocupação do sítio como cemitério resgataram-se 83 esqueletos humanos encontrados em bom estado de conservação. As condições ambientais favoreceram a rápida desidratação da matéria orgânica e a preservação da pele, dos cabelos e do cérebro em alguns indivíduos, bem como do artesanato em palha utilizado no ritual funerário. É de notar a persistência de um padrão de sepultamento em que os corpos eram colocados na posição fletida (fetal), amarrados com cipós e embrulhados em esteiras de folhas de palmeira, compondo verdadeiros fardos funerários. Os recém-nascidos eram depositados em pequenos cestos ou em espatas de palmeiras e não levavam adornos, ao passo que os adultos estavam acompanhados de colares e alguns levavam flautas ósseas e tacapes.

Estudos de antropologia biológica realizados sobre esses esqueletos revelaram tratar-se de uma população homogeneamente braquicéfala, de estatura média-baixa, robusta, com estado de nutrição satisfatório e boa adaptação às condições ambientais. O acentuado desgaste plano dos dentes e a ocorrência de poucas cáries nesses indivíduos indicam uma alimentação à base de vegetais não cozidos, característica observada em grupos caçadores coletores. Esse grupo humano pré-histórico era portador de patologias como a espinha bífida oculta, atribuída ao consumo de batatas tóxicas, variação numérica das vértebras (presença de uma vértebra a mais no sacro e na região lombar), conseqüência de casamentos consangüíneos, osteofitose e artrose, além de fraturas freqüentes decorrentes de quedas sobre a bacia e os pés. Boa parte do material resgatado na Furna, bem como artefatos em cerâmica, fragmentos de pinturas rupestres e material lítico, encontram-se em exposição nos Museus Histórico do Brejo da Madre de Deus e de Arqueologia da UNICAP, no Recife.

Outras coleções

Há ainda duas importantes coleções arqueológicas no Estado. A primeira delas é a do Museu de História Natural do Ginásio Pernambucano, no Recife, organizado em 1858 pelo naturalista francês Luis Jacques Brunet, à época professor da Disciplina de História Natural no Ginásio, e que consiste em um total de 3.865 peças catalogadas nas áreas de Arqueologia, Botânica, Geologia e Zoologia, com a parte de Arqueologia Pré-histórica havendo sido descoberta pelo professor Armand François Laroche no município de Bom Jardim. Na Capital, também é possível visitar o Laboratório de Arqueologia da UFPE. Já no Interior, o destaque cabe ao Museu Carmelitano de História Natural, em Camocim de São Félix, fundado pelo frei Telésfero Machado do Carmo em 1963 e no qual se encontra uma infinidade de peças catalogadas em 15 setores, com destaque para os de Anatomia (corpo humano), Entomologia (insetos), Mineralogia (minerais), Paleontologia (fósseis), Petrologia (pedras), Taxidermia (animais empalhados) e Zoologia (animais).

sábado, 13 de março de 2010

100 coisas para não perder em Pernambuco - Parte 2

11. Estátuas do Circuito da Poesia – “Recife, não a Veneza Americana, não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais, não o Recife dos Mascates (...) Recife da minha infância” (Evocação do Recife, Manuel Bandeira). Tendo por escopo homenagear os maiores expoentes da cultura pernambucana e aproximá-los da população, o Circuito da Poesia consiste num conjunto de estátuas-monumento de autoria do artista plástico Demétrio Albuquerque, situadas em locais que fizeram parte do cotidiano dos poetas ou em espaços que foram abordados em sua obra. Os homenageados são, em ordem alfabética: Antônio Maria (Rua Bom Jesus), Ascenso Ferreira (Cais da Alfândega), Capiba (Rua do Sol), Carlos Pena Filho (Praça da Independência), Chico Science (Rua da Moeda), Clarice Lispector (Praça Maciel Pinheiro), João Cabral de Melo Neto e Manuel Bandeira (Rua da Aurora), Joaquim Cardozo (Ponte Maurício de Nassau), Luiz Gonzaga (Estação Central), Mauro Mota (Praça do Sebo) e Solano Trindade (Pátio de São Pedro).

12. Pátio de São Pedro - Ao redor da portentosa Igreja de São Pedro dos Clérigos (1728) surgiu este charmoso espaço em formato trapezoidal, quase isolado do resto do conjunto urbanístico do Bairro de Santo Antônio. O Pátio guarda, em seu traçado, vestígios do urbanismo holandês, como o primitivo alinhamento das casas da Rua das Águas Verdes. O grande destaque do conjunto, todavia, cabe à Igreja, a única em partido poligonal do Nordeste e exemplo típico do efeito ótico característico do barroco religioso brasileiro, expresso na assimetria do conjunto arquitetônico, na infinitude do espaço e no movimento contínuo. Apesar da prevalência barroca, a Concatedral é, também, um modelo de hibridismo arquitetônico, agregando traços do maneirismo e convivendo lado a lado com detalhes do rococó e do neoclássico. Atualmente o Pátio abriga o Memorial Luiz Gonzaga e vários eventos culturais, além de contar com uma agitada vida noturna.

13. Basílica do Carmo e Casa da Cultura - No lugar onde o Conde Maurício de Nassau fez erguer o Palácio da Boa Vista (1643), destinado ao seu repouso e lazer, jaz atualmente a Basílica do Carmo (1767) e o convento no qual Frei Caneca fez seus votos religiosos e, presume-se, está enterrado. Em estilo barroco-rococó, o imponente templo tem sido um dos pontos centrais da fé católica no Recife, mormente por ser a Virgem do Carmo a padroeira da Capital. Em suas proximidades encontra-se a também imperdível Casa da Cultura (1850), funcionando desde 1976 no edifício da antiga Casa de Detenção em que esteve preso João Dantas após o assassinato do proeminente político paraibano João Pessoa, em 1930. Nessa mesma Casa, meses mais tarde, João Dantas viria a se suicidar por temer cair em mãos das tropas revolucionárias. Além de dispor do melhor do artesanato local, a Casa da Cultura abriga o Museu do Frevo, localizando-se ao lado da belíssima e neoclássica Estação Central/Museu do Trem (1885).

14. Faculdade de Direito - É impossível dissociar a história da prestigiosa Faculdade de Direito do Recife da trajetória acadêmica brasileira. Criadas, ela e sua congênere do Largo de São Francisco (SP), em 11 de agosto de 1827 por determinação do Imperador D. Pedro II - razão pela qual o 11 de agosto é considerado o Dia do Estudante -, é a segunda mais antiga instituição de ensino superior do país, perdendo apenas para a Faculdade de Medicina da Bahia. Tendo funcionado inicialmente no Mosteiro de São Bento, em Olinda, foi transferida para o garboso Palácio em estilo eclético da Praça Adolfo Cirne em 1912, havendo sido integrada aos quadros da conceituada UFPE, uma das 10 melhores universidades do país, em 1946. A instituição foi palco da rivalidade entre Castro Alves e Tobias Barreto, este o fundador do movimento intelectual conhecido como "a Escola do Recife", e viu passar por seus quadros figuras da envergadura de Rui Barbosa, Joaquim Nabuco e Ariano Suassuna.

15. Empresariais da Ilha do Leite e Fórum - Nos últimos anos, o Bairro da Ilha do Leite vem sofrendo um boom imobiliário, convertendo-se em uma espécie de "Manhattan recifense". Não é de surpreender: cortado pela Av. Agamenon Magalhães, a principal artéria da Capital, é lá que se concentra o Pólo Médico de Pernambuco, tido como o segundo melhor do Brasil. As últimas aquisições da área foram os belos e arrojados Empresariais Isaac Newton e Alfred Nobel, de autoria do arquiteto Jerônimo da Cunha Lima, que nada deixam a dever ao novo Fórum (1997) situado ao lado, grande destaque do complexo e assinado por Paulo Raposo e Andréa Câmara. Nele, transparecem valores clássicos mesclados a contemporâneos, numa atmosfera grave e solene que constitui sóbria expressão arquitetônica da Justiça enquanto instituição. Não muito longe dali e ainda na Av. Agamenon Magalhães, convém ressaltar, o Empresarial Burle Marx, da arquiteta Lorena Morais, explora com peculiaridade o deconstrutivismo arquitetônico.

16. Bairro de Boa Viagem - Boa Viagem é, possivelmente, o mais famoso Bairro do Recife. A razão? Estar ao lado do verde mar de águas mornas (média de 26ºC), resguardado por uma barreira de arrecifes que dá origem às simpáticas piscinas naturais cartão-postal da Capital - diga-se de passagem que confortavelmente a salvo dos temidos ataques de tubarão resultantes do desequilíbrio ecológico causado pela construção do Porto de SUAPE. Uma ampla avenida em que se erguem altos e elegantes edifícios residenciais e hoteleiros, além de bares e restaurantes, acompanha a orla de 7km desta que é a praia urbana mais limpa do Brasil. A atividade no amplo calçadão, dotado de completa infra-estrutura de lazer e de concorridos quiosques, é intensa, especialmente defronte ao Edifício Acaiaca, bem como nas imediações da Praça na qual está situada a pequenina Igreja que deu nome ao Bairro. Vizinha do polêmico Parque Dona Lindu, do prestigiado arquiteto Oscar Niemeyer, lá é possível encontrar artesanato e o melhor da gastronomia local. Já no interior do Bairro, os destaques cabem ao edifício Califórnia (1959), ícone do modernismo projetado por Acácio Gil Borsói, e ao arrojado Empresarial Blue Tower, de Marco Antônio Borsói.

17. Shopping Recife - Se tem algo de que os recifenses se orgulham é de seu imenso Shopping Center, outrora o maior da América Latina e atualmente o 4º maior do país. Centro comercial por excelência do Bairro de Boa Viagem e indispensável ao cotidiano dos habitantes da Capital, o Shopping Recife surgiu em 1980, pioneiro no Estado, com 72 lojas e pouco mais de mil vagas de estacionamento. Atualmente, após 3 ampliações, os números impressionam: são 410 lojas, sendo 9 âncoras e 6 megalojas, 10 salas de cinema multiplex e mais de 5 mil vagas de estacionamento, além de um grande pólo gastronômico com 4 praças de alimentação e 17 restaurantes, contabilizando um movimento anual total de cerca de 40 milhões de pessoas. Como se não bastasse, no exterior do mall, numa área de 19 mil m², os visitantes são presenteados com o interessante Parque das Esculturas, que reúne 35 obras de grandes artistas pernambucanos como Abelardo da Hora, Francisco Brennand e Marianne Peretti.

18. Capuchinhos/Frei Damião – Fenômeno de popularidade religiosa no Nordeste apenas comparável ao Padre Cícero, Pio Gianotti (1898-1997) foi um missionário italiano da Ordem dos Capuchinhos que, até seus últimos dias de vida, dedicou-se à evangelização nos lugares mais ermos da Região, à qual chegou em 1930 e na qual era conhecido como Frei Damião de Bozzano. Consta que o frade partia cedo da madrugada em procissões que, via de regra, reuniam milhares de fiéis, peregrinando rumo às comunidades mais carentes, as quais despertava com o badalar de um sino, cânticos e orações. Durante essas oportunidades, celebrava casamentos coletivos e batismos, fazia sermões e ouvia confissões, angariando a simpatia popular, que o aclamou “santo” ainda vivo. Falecido quase centenário, jaz enterrado na Capela de Nossa Senhora das Graças do Convento de São Félix, no Bairro do Pina (ao lado do de Boa Viagem). É de ressaltar que, desde 2003, corre no Vaticano o processo de beatificação do chamado “Andarilho de Deus”.

19. Rio Capibaribe e Bairros Nobres da Zona Norte – O “Cão sem plumas” do poeta João Cabral de Melo Neto está ligado da maneira mais íntima à história do Recife. Foi em sua várzea que primeiro se consolidou a cultura açucareira no Nordeste. Às suas margens cresceu a Capital. Os atuais Bairros Nobres da Zona Norte - Aflitos, Apipucos, Casa Forte, Derby, Espinheiro, Graças, Jaqueira, Madalena, Parnamirim, Poço da Panela, Tamarineira, etc. -, em sua maioria cortados pelas soberbas avenidas Rosa e Silva, Rui Barbosa e 17 de Agosto, eram antigos engenhos, ainda conservando a descendência das mais tradicionais famílias do Estado. O mais rico deles é a Jaqueira, o aristocrático Bairro estabelecido ao lado do Parque homônimo, o melhor da Capital, espécie de Leblon recifense, com a charmosa Livraria Jaqueira em suas imediações. O mais famoso, todavia, é Casa Forte, com sua bela Praça projetada por Burle Marx (ver item 21) e o ótimo Museu do Homem do Nordeste da FUNDAJ (ver item 20).

20. Museus da Zona Norte – Nos supramencionados Bairros Nobres, encontram-se 3 dos principais Museus pernambucanos. O mais importante é do Estado (Graças), criado em 1928 e funcionando no antigo Solar Imperial do Barão de Beberibe desde 1940 - uma atração à parte, diga-se de passagem, com sua bela estatuária emoldurando os jardins, nos quais, todas as manhãs de domingo, acontece uma chamosa Feira de Antiguidades. O acervo de mais de 14 mil itens do MEPE agrega importantes coleções, qual a referente ao Brasil holandês, com um raro exemplar do livro de Gaspar Barléus e os painéis a óleo dos heróis da Restauração. Já o Museu do Homem do Nordeste da FUNDAJ (Casa Forte), idealizado por Gilberto Freyre em 1979, reúne os acervos do antigo Museu do Açúcar, do Museu de Antropologia e do Museu de Arte Popular, apresentando uma síntese da história e da cultura do homem nordestino. A Fundação Gilberto Freyre (1987), na antiga residência do intelectual (Apipucos), encerra a tríade, expondo objetos pessoais do ilustre sociólogo, antropólogo e escritor pernambucano, bem como trabalhos de Cícero Dias, Lula Cardoso Ayres e Di Cavalcanti na rica Pinacoteca.